Estudantes, jornalistas e representantes de organizações da sociedade civil se reuniram na terça-feira, 27 de setembro, em São Paulo, para Ato em Defesa do Jornalismo e da Democracia. As entidades organizadoras lançaram ao final do evento um Manifesto, no qual ressaltam os riscos que os jornalistas brasileiros sofrem pelo seu exercício profissional.
Leia abaixo o manifesto na íntegra
EM DEFESA DO JORNALISMO E DA DEMOCRACIA
Nós, jornalistas, recebemos em junho deste ano uma das notícias mais devastadoras em tempos já marcados por tantas perdas e dores. Todas e todos os profissionais da imprensa também morreram um pouco quando o jornalista Dom Phillips e o indigenista Bruno Pereira foram covardemente assassinados enquanto realizavam o seu trabalho.
Um crime ocorrido na Amazônia, em uma longínqua região do Brasil, do ponto de vista daqueles que vivem nas grandes cidades, poderia ser considerado um trágico e isolado episódio. Mas não. As mortes de Dom e de Bruno foram a materialização mais cruel e devastadora das centenas de casos de ameaças, agressões, ataques virtuais e físicos e tentativas explícitas de silenciamento que jornalistas enfrentam nos últimos anos.
Ser jornalista no Brasil é uma profissão de alto risco. Para profissionais que trabalham em grandes e tradicionais redações ou em veículos digitais e independentes. Quem exerce sua profissão nas metrópoles ou os que lutam bravamente para prover informações nos tantos desertos de notícias que se espalham pelo país. Jornalistas que cobrem a grande política nacional ou os fatos do cotidiano. Estamos expostos, realizando nosso ofício em permanente estado de tensão e insegurança.
Para as mulheres, isso é ainda pior. São ataques de evidente cunho machista e misógino, em linchamentos virtuais, divulgação e exposição de dados pessoais, e ameaças com gestos e palavras em coletivas de imprensa, entrevistas e coberturas na rua.
É verdade que trabalhar com jornalismo no Brasil nunca foi fácil. Durante boa parte do século 20, exercemos nosso trabalho sob regimes ditatoriais que impuseram a censura, a intimidação, o silenciamento da imprensa e a morte de jornalistas, como no caso de Vladimir Herzog. E, mesmo em um passado recente, os crimes que enlutaram nossa categoria, como o assassinato de Tim Lopes, há 20 anos, são lembretes de nossas enormes fragilidades e contradições enquanto nação.
Mas é incontestável afirmar que desde o dia 1º de janeiro de 2019, nossa profissão se tornou ainda mais perigosa. Jair Bolsonaro elegeu os jornalistas como inimigos, por meio de permanentes tentativas de descredibilização, ridicularização, ameaças e ataques diretos.
Como era de se esperar, a postura vinda do chefe do Poder Executivo estimulou seus apoiadores a fazer o mesmo contra a nossa categoria. Como indicam os diferentes estudos das organizações que defendem o jornalismo e os jornalistas, nos tornamos alvo dos desejos autoritários de silenciar a livre circulação de informações. Se de fato não estivéssemos enfrentando um verdadeiro projeto obscurantista de poder, por que tanto medo em enfrentar as perguntas de repórteres, os questionamentos que são inerentes à democracia?
Neste ano, desde o início do período eleitoral, os ataques, ameaças e tentativas de censura crescem dia após dia. As entidades aqui presentes estão unidas com a certeza de que precisamos dar um basta ao ódio e à violência. De maneira coletiva, nossa categoria se levanta para defender o jornalismo, a liberdade de imprensa e a democracia.
Nós, jornalistas, estivemos na linha de frente na cobertura da pandemia e reafirmamos nossa função social para a sociedade. Neste ano, mais uma vez, comprovamos que o nosso trabalho é fundamental para o fortalecimento da soberania popular. E, agora, afirmamos de maneira firme e determinada que não aceitaremos nenhum tipo de intimidação, de ameaça à nossa profissão e as demonstrações golpistas que tentam destruir nossa democracia.
Nós resistimos e resistiremos. Seguiremos cumprindo nosso dever de levar informações de interesse público para toda a sociedade, com ética jornalística e profissionalismo. E temos certeza de que o medo, o ódio e a violência não vencerão. Viva a democracia, o povo brasileiro e a luta de cada jornalista deste país!
O documento é assinado por Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo (SJSP), Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), Associação Brasileira de Imprensa (ABI), Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), Associação de Jornalismo Digital (Ajor), Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), Repórteres sem Fronteiras (RSF), Instituto Vladimir Herzog, Associação Profissão Jornalista (ApJor), Barão de Itararé, Intervozes, Fotógrafas e Fotógrafos pela Democracia, Associação de Jornalistas de Educação (Jeduca), Associação Paulista dos Jornalistas Veteranos, Centro Acadêmico Vladimir Herzog, Centro Acadêmico Benevides Paixão.
Foto: Cassia Belini